segunda-feira, 24 de novembro de 2014

CAMINHOS






















São muitos, mas às vezes bastante sutis, os caminhos que se apresentam ante as incertezas e surpresas que a vida oferta em sua sinuosa e complexa trajetória. São contingências quase sempre sinalizadoras de imperativas transformações, que podem ou não exigir sacrifícios.  Talvez mesmo a boa sabedoria e o equilíbrio sejam o esculento basilar para os próximos passos, apesar de não compactuar tão facilmente, e para todas as circunstâncias da vida, com este último traço comportamental ou com esta conduta exigida para todos nós.

A ideia, que imagino esteja na mente da grande maioria dos indivíduos, é a de sempre progredir, tal qual, com esmerado saber, nos ensina a doutrina kardecista em relação ao espírito. Por mais que a vida seja pontuada de idas e vindas e que, como bem disse o poetinha*, “ser a vida a arte do encontro, apesar de tantos desencontros na vida”, ela – havendo, sobretudo, sensibilidade e disponibilidade para a escuta - ensejará as preciosas oportunidades de revisão de conceitos, de mudança de opiniões, de reconhecimento dos nossos erros, de absorção de novos e interessantes valores e, por aí, por essas veredas da transformação e do conhecimento, seguirá sinalizando a sua rica, contraditória e, por isso mesmo, bela senda.

Portanto, saudável é sermos sensíveis e disponíveis, respectivamente para o âmago dos nossos sentidos, para o que “dentro pulsa”, para a naturalidade dos nossos sentimentos (em detrimento de tantas cobranças e convenções pré-fabricadas, “exteriores”); e menos preocupados com o que se costuma propalar como sendo “padrão social” ou “politicamente correto”.  As aparências, por mais que se desvelem extravagantes ou mascaradas, não iludem, por longa temporalidade, aquilo que se esconde ou até mesmo se tenta ignorar no recôndito da alma. Os faróis faciais, cedo ou tarde, abrupta ou sutilmente, através dos contraditórios e até mesmo inesperados olhares, denunciam! Necessário refletir e serenamente caminhar!


R. Dantas
Novembro/14

*Vinicius de Moraes


terça-feira, 18 de novembro de 2014

POEMA ABSORTO





Porta aberta para o entardecer
por onde vejo o sol em desmantelo.
Em mim a memória sendo o elo
entre o medo e a vontade de ser.

Cicatrizes de dores passadas
que ainda hoje sutis se desnudam.
Crepúsculo de nuvens condensadas,
levemente escurecem e mudam.

Aos poucos me invade a calmaria
feito um barco no rio largado.
E na rede me vem a fantasia
de ser um vivente iluminado.

O silêncio da noite companheiro
renova o desejo de ser poeta.
De livre perder-se por inteiro
nos atalhos sem linha reta.

E no seio de toda essa viagem,
a ditar serenamente meu pulso,
está você em lívida imagem
provocando o imediato impulso.

Abandonei-me, aqui, serenamente,
deixei-me pelos seus olhos levitar.
E tudo que produzirei na mente
ao seu encontro me levará.

Roberto Dantas
Novembro/14






POEMA ATALHOS DO TEMPO













Nesses atalhos de alecrins,
morada dos silentes querubins,
descansei o meu corpo sedento.
Inefável é o doce aroma
que me prende nessa redoma
purificando todo o tempo.

Ínvios caminhos do sertão,
que trago na palma da mão,
são as veredas da felicidade.
Lajedos, córregos, serras, capim,
paragens que dentro de mim
subvertem a vil realidade.

Maria Preta, Uauá, Caratacá,
Vaza Barris, Rio das Pedras, Quitá,
João Batista, Abade e Conselheiro.
Lugares e gentes que agora vejo,
rasgos de luz, raros lampejos,
fustigando ao coração catingueiro.

Roberto Dantas

Nov / 2014.




domingo, 9 de novembro de 2014

O TURISCULT QUE FOI POSSÍVEL




É com grande lamento que vimos manifestar as nossas frustrações e questionamentos a quem de direito -  mais especialmente, aos organismos das diversas esferas gestoras desta nossa UNEB -, em razão, portanto, da inviabilidade de se realizar um evento de caráter eminentemente acadêmico-cultural, o qual, necessário é dizer, além de ter sido idealizado por professores e estudantes e voltado democraticamente para toda a comunidade unebiana, foi devidamente planejado e, com considerável antecedência, apresentado aos já mencionados setores constituintes da administração desta universidade.

Apenas para pontuar o que acima foi dito e expressar o nosso grande lamento, esclarecemos que a proposta do evento “TURISCULT: a cultura popular do sertão” atendeu aos ditos pré-requisitos acadêmicos administrativos e que sempre são “convencionados” como politicamente corretos, ou seja: a proposta foi em tempo hábil – FINAL DE MAIO DO CORRENTE ANO! - apresentada e aprovada em reunião do Colegiado de Turismo e Hotelaria, ao qual estão vinculados os seus idealizadores; apresentada à Direção deste DCH I; aprovada no Conselho Departamental e, atendendo solicitação posterior, também inscrita no NUPE e catalogada no SIP. Portanto, um evento – forçoso mesmo ressaltar! - adequadamente oficializado e fiel aos prazos estipulados pelas instâncias universitárias!


Apesar desses cuidados, o que para nós ficaram patentes, configurando-se como inadequadas condutas e injustificáveis respostas, foram a indisponibilidade, a irresponsabilidade, às vezes mesmo a má vontade e, sobretudo, a incompetência para atendimento de um simples pleito acadêmico, sobretudo quando concebemos que a universidade enquanto casa soberana e plural dos saberes – como, aliás, o nome já claramente expressa: UNIVERSIDADE -, pode e deve acolher a cultura no seu laborioso cotidiano, não se resumindo as suas atividades, como ainda muitos profissionais medíocres pensam e tentam impor, à sala de aula! É na universidade, na qual há o chamado tripé acadêmico conformado pelas ações de ensino, pesquisa e extensão, que se dá, inclusive, o saudável e produtivo encontro das culturas, vale dizer das identidades e, justamente a partir de abordagens críticas e responsáveis, é que aprendemos a respeitar, com dignidade, as diferenças!




Assim nos manifestamos e, com firmeza, marcamos nossa posição para que outros propositores, nos seus legítimos desejos de produzirem iniciativas de igual significância, estejam “vacinados” para o enfrentamento de barreiras inaceitáveis e possam, com melhor sorte, realizar os seus projetos.  As desculpas historicamente propaladas pelos gestores para o não atendimento dos nossos pleitos sempre se fundaram e ainda se escondem nas ditas “amarras da burocracia”. Entretanto, justamente para fugir ou se prevenir destas tão questionáveis ilações, tudo fizemos com considerável tempo para as possíveis resoluções e acatamos a todas as exigências acadêmicas! Portanto, há algo a mais a ser decifrado e corrigido nesse ambiente de inadimplências e incertezas!

Ao mesmo tempo, torna-se necessário destacar a fidalguia e o interesse com que o Senhor Diretor do DCH I acolheu à proposta e a todos nós, seus idealizadores, sempre quando procurado. Mas não foi suficiente.

Muito danosas são as conseqüências quando, por razões e entraves descartáveis, se frustra uma proposta cultural dessa natureza, que objetivava congregar os corpos universitários – professores, estudantes e funcionários -, pois que tanto desestimula àqueles que, com criatividade e dedicação, buscam realizar seus intentos, quanto aos que obteriam novos e relevantes conhecimentos, obviamente fundamentais para a caminhada universitária. Hoje, aqui, intentava-se, dentre outras ações benéficas, a uma melhor e mais justa visibilidade das expressividades da cultura popular do nosso sertão. Entretanto, mais uma vez, foi abortado um canal propício e imperativo para o livre exercício de tal iniciativa!





Por fim, sensibilizados, agradecemos a todos os que colaboraram e, sobretudo, se irmanaram com a nossa ideia. Agradecemos ao Colegiado de Turismo e Hotelaria, à sua coordenadora e à sua secretária, e aos estudantes protagonistas do TURISCULT, ao tempo em que salientamos que o silêncio ou a conivência não poderiam fazer e jamais farão parte das nossas condutas.


EQUIPE TURISCULT.
Novembro de 2014.




quarta-feira, 5 de novembro de 2014

FÉ E RESISTÊNCIA SOB UM SILÊNCIO REVELADOR



















Pelos atalhos, ainda quase desertos, que os lajedos sinuosamente desenham e que os filetes d’água intermitentes singularmente embelezam a rude catinga do sertão de Uauá, concebi - mais do que isso senti! - a fé inegociável e a sanha indomável dos guerreiros conselheiristas quando dos dias tormentosos da fratricida guerra sertaneja. Transcorridos quase cento e vinte anos das sangrentas batalhas, aqui, conduzido por esse silêncio sepulcral e como que transportado para aqueles tempos idos, imagino João Abade a combater Pires Ferreira e, assim, com muito respeito, também silencio no recôndito mais profundo do coração o lamento das lágrimas que ainda teimam escorrer na minha face de sonhador. Reminiscências que não se apagam.


Aqui, onde no passado florescia uma pacata vila de pobres viventes, abençoada, depois, pelas graças de São João Batista, seu amado padroeiro, uma tropa militar de mais de cem soldados padeceria cruel embate numa luta que a história registrou como sendo o “Primeiro Fogo da Guerra de Canudos”. Aqui, naquele novembro de 1896, quem não fugiu para negar apoio aos invasores, amoitou-se, sob preces, em seu casebre, ou clandestinamente colaborou com os irmãos adeptos do grande e fervoroso guia dos mal-aventurados, o peregrino Antônio Conselheiro. Eram dias difíceis, de seguidas e graves conturbações políticas, mas, sobretudo, dias de carestia e de desumanas exclusões, quando a maioria dos sertanejos – sempre esquecidos pelas autoridades constituídas ou explorados pelos seus patrões autoritários - buscava e encontrava algum refrigério na palavra e, especialmente, nos atos do citado andarilho. Dias do Belo Monte Conselheirista. Dias da nova e contraditória era republicana no Brasil. Dias de Conselheiro.





Aqui também passa o Vaza Barris, rio que então banhava o solo comunitário belomontense em que pululavam quase trinta mil almas. Solo sagrado em que muito se pediu graças ao Bom Jesus; eito em que foram edificadas milhares de moradias, onde respectivamente se plantou e se colheu sementes e frutos; terra onde foram criados muitos filhos e se estabeleceram devotados sertanejos; comunidade que, apenas vencidos três anos de sua laboriosa existência, com impensável denodo e assustadora disposição, envidou suas defesas, mas que, finalmente, pereceria, após longos onze meses, ante as bombas e as dinamites, ao querosene e ao insano canhoneio. Mas do que isso: ante a covarde “gravata vermelha”! História ao mesmo tempo belíssima e dramática de um povo crente e trabalhador. Seu grande e inesquecível legado: fé e resistência!

E essas duas valorosas expressões me fazem, aqui à beira desse filete d’água do mesmíssimo e histórico rio, às portas de Uauá, serenamente refletir. Fé que ainda hoje – e novamente me entrego àquele silêncio revelador – é percebida em seus atuais residentes, consignada em tantos momentos de seu cotidiano adverso, todavia, mais especialmente vivenciada quando dos ritos e louvores carinhosamente dedicados ao santo padroeiro nos dias de junho. O amado São João Batista que abençoa e ilumina o povo uauaense e a esta “Terra dos Pirilampos”. Fé que se renova e cotidianamente se atrela à resistência, hoje não mais ensejada numa guerra para expulsão de indesejados visitantes! Mas uma resistência que se desnuda, tão corajosa quão sedutora, nas expressões de sua cultura sertaneja, de cunho eminentemente popular. Pois que Uauá é, no sertão da Bahia, o gracioso e acolhedor recanto da musicalidade e da poesia, fundadas na sensibilidade e virtuosidade de seus compositores, cantadores e instrumentistas. Afinal, manifestações culturais imprescindíveis enquanto saudável esculento para a alma.





São sanfoneiros, zabumbeiros, tocadores de pífaros e de pé de bode, cantadores, cordelistas, aboiadores e poetas populares, enfim uma plêiade de artistas de rara qualidade a esvurmar, sem descanso e com singular alegria, os seus nobres talentos. Pois que Uauá, além de ter sido a trincheira primeira e vitoriosa do povo do Conselheiro, e de ser a encantadora capital do bode e do saboroso umbu, sempre foi e será festa!  Uauá é São João, é alvorada junina, é vida, é vaqueiro, é história. É sertão!


Salve Uauá!

Roberto Dantas
Novembro/2014



segunda-feira, 3 de novembro de 2014

SALVE MESTRE CAVACHÃO DE UAUÁ!

SALVE!
02 de novembro de 2014









Um dia de merecida celebração! Um domingo inesquecivelmente feliz! Recepcionado por tantos e talentosos artistas, por inúmeros amigos e admiradores e, em especial, saudado pela sua família, assim Cavachão, além de completar oitenta e três anos de uma trajetória de vida pautada pela labuta, pelas andanças, pela música e pelo riso, lançou o seu livro - "Mestre Cavachão" - no acolhedor Espaço Cultural Toque de Zabumba, na não menos acolhedora "Terra dos Pirilampos", a histórica Uauá da Guerra de Canudos, do bode, do umbu, das alvoradas juninas dedicadas a São João Batista e, certamente, maior recanto da cultura popular do sertão baiano.

Honestamente sensibilizado, tive a honra de, ao lado dos grandes amigos Max Ribeiro, Gildemar Sena e Pedro Peixinho, colaborar com a organização da merecida obra que versa sobre a vida e a produção musical - tantas composições! - do reverenciado mestre, patrocinada pela Prefeitura Municipal de Uauá.

Sublimes as presenças de tantos parceiros da chamada "Velha Guarda" e tantos amigos fraternos de Cavachão, dentre outras as de Veinho Sanfoneiro, D'Assis Sanfoneiro, Janjão, Zé de Auto, Gigi Ramos, Olímpio Cardoso, Dona Epifânia e Deoclécio Aboiador. Mas, igualmente, prazerosas presenças de outros talentos da música e da poesia popular, a exemplo de Zecrinha, João Sereno, Rennan Mendes, Claudio Barris, Ricardo Dom, Jorjão da Zabumba, Marcos Fonte Nova, Bosco do Realejo, Romarinho, Victor Fidel, BGG da Mata Virgem.


                                     (Veinho Sanfoneiro e Mestre Cavachão)

Bolo em forma de viola, foguetório, discursos, poesia e muita cantoria! Portanto, uma festa de alegria e de muita emoção, dois singelos sentimentos que o querido mestre sempre dedicou e naturalmente provoca em seus conterrâneos, como de resto em todas as pessoas que dele se aproximam, seduzidos pela sua simplicidade e simpatia.


  (M. Fonte Nova, Zecrinha, João Sereno, Cavachão e Rennan Mendes)


                                     (Max Ribeiro, Mestre Cavachão, R. Dantas e Fidel)
                                      
Parabéns Mestre Cavachão! Salve o sertão de Uauá!

Roberto Dantas.